agora sou jangada

na aridez da minha memória vinha vendo a vida como o sertão: seus vazios. sem borda, sem fronteira, sem porta para exílio. então o que esta chave abre? quem habita comigo nessa solidão, se não existe calvário com lugar para dois?
minha amiga me lembra sempre que ao redor do buraco, tudo é beira. e eu tenho que conviver com essas beiras, ou não seria o sertão seus buracos. mas suspeito que essa margem, de tanto martelar, rompeu o dique que separava o sertão do mangue.
de repente, a aridez virou zona úmida. de repente, tem jangada no mar. sim!, o arrastão vai entrar no mar sem fim. chega de sombra, ei, joão! falando em joão, o tempo andou mexendo comigo, mas eu não esqueço: a felicidade é uma arma quente. cuidado!
hoje tudo é mangue: estes caminhos – e suas travessias.
mas não posso esquecer do que disse minha amiga: na travessia, a gente sempre deixa sangue no mangue.